Aos alfarrabistas,
guardiães de vasos sagrados*
Os livros são o meu descanso.
E tal como se quer uma cama
(nem muito mole nem demasiado dura),
assim também gosto de estender a alma
sobre aqueles que me devolvem o vigor e a frescura.
Os meus amigos mais íntimos nunca os vi,
pois durmo com eles debaixo do colchão.
Como aquele tesoiro mais sagrado
guardado na palma da mão.
Livros novos, pelo uso, tornaram-se velhos
pela companhia que sempre dão.
Mas é aos velhos que eu mais quero
(cobertos de pó e esquecidos)
Descobertos no sótão ou rés-do-chão.
Ensina-me a tua fome e o teu segredo
Bichinho de prata, meu amigo.
Para alimentar-me como tu
De silêncio, palavras… renascido!
Esta tarde fui passear à Arrábida
Com Sebastião da Gama pela mão.
Depois, subi a Monsanto,
Tendo por cajado a Namora
E Miguel Torga no coração.
Jamais morrerão
Pois ressuscitam sempre como o grão de trigo,
Poetas, Escritores e Artistas
No corpo e na alma de um Amigo.
Nélio Mendonça, ofm
Chimoio* , 23/06/2001
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*“Os poetas [e artistas] são vasos sagrados” (Holderlain).
*Antiga Vila Pery, actual capital provincial de Manica (Moçambique)